«Quem não estiver cá para dar tudo o que tem, não está cá a fazer nada» - Hugo Costa

O futsal do Atlético viveu momentos altos durante os anos 80 e 90 do Século passado. Depois disso foi caindo, até descer aos escalões distritais. Recentemente voltou a disputar os escalões nacionais durante quatro temporadas, até que o Clube se viu obrigado, face à actual crise, a desistir dos campeonatos nacionais e a começar do zero. Para Coordenar esta nova fase da vida da modalidade, que está em actividade no clube há mais de três décadas, a Direcção escolheu um jovem de 31 anos. Nascido e criado em Alcântara, antigo funcionário do Clube, que passou pela estrutura do futebol de formação, além do futsal. Hugo Costa encontra o futsal no pior momento da sua história, mas não vira a cara à luta. Luta essa que faz parte do ADN do Clube.

O Atlético foi uma das potências do futsal aquando do início da modalidade. Em 2000, dois atletas, Majó e António Teixeira, ajudaram Portugal a conseguir a medalha de bronze no Mundial da Guatemala.


Como é que o Atlético surge na tua vida?
De forma natural. Enquanto crianças somos estimulados pelos impulsos que os nossos progenitores nos dão, e no meu caso isso sucedeu da forma mais natural possível. Eu cresci no Bairro do Alvito, os meus avós paternos viviam no Bairro do Jacinto, no prédio que fica paredes-meias com o Estádio da Tapadinha, a minha irmã mais velha jogou voleibol no Clube, assim como as minhas tias paternas, que fizeram parte da equipa que obteve conquistas no início dos anos 80. O meu pai era seccionista do voleibol feminino, a minha mãe praticou basquetebol no clube. A minha família, tanto da parte do meu pai, como da minha mãe, tinha ligação ao Atlético. Eram do Atlético, e passaram-me isso. É o meu clube, não tenho outro, apesar de nutrir simpatia pela Associação Académica de Coimbra e pelo Vitória Sport Clube.

Aquilo que o meu Pai sempre me transmitiu acerca do Atlético era que o Atlético era um clube de gente guerreira, de fibra. A malta de Alcântara não era para brincadeiras (risos). Tudo se fazia pelo Clube, com todas as dificuldades a malta cerrava os dentes e ia à luta. E foi sempre isso que eu também tentei transmitir aqueles que conviviam comigo.

Durante a minha juventude acompanhei com regularidade o Atlético, depois quando tive que me fazer à vida fiquei, fisicamente, longe, mas a acompanhar, como podia, a vida do Clube. Há cinco anos voltei a residir em Lisboa, e voltei a acompanhar a vida do Clube, até que surgiu o convite para trabalhar no Atlético, por parte do antigo Presidente, o Senhor Almeida Antunes. Durante três anos, sensivelmente, fiz de tudo um pouco.

Hugo Costa será o Coordenador
da equipa sénior, e aponta a subida como objectivo.
Como surgiu esta oportunidade e porque aceitaste o desafio?
Foi através de um convite feito pelo Vice-Presidente para as modalidades, o Dr. Carlos Filipe. E foi, de todas as formas, algo inesperado para mim, e acredito que para muita gente. O que circulava pelos corredores do futsal, por assim dizer, era que o Clube ia desistir da modalidade, era algo que estava dado como uma certeza. E eu próprio estava a estudar alguns convites que tinha em mãos para treinar. Quando me fizeram o convite fiquei sem reacção. No pior momento da vida do Clube ser convidado para dirigir uma secção é um desafio que, acima de tudo, exige muito compromisso. Mas, tal como o meu Pai me ensinou, não se diz não ao Atlético. Tivemos uma reunião e eu coloquei em cima da mesa as minhas condições, que eram as mesmas da Direcção.

Com cerca de 12/13 anos comecei a acompanhar mais o Atlético, e lembro-me de grandes jogadores que foram referências na minha infância e que tentava imitar, como o Drula e o Majó. Mas vibrei com muitos outros como o Naná, António Teixeira, Nuno Almeida ou o Vitinha, só para citar alguns.

Eu cresci a ver o Atlético a bater-se no futsal com os maiores, e por isso não houve uma motivação para aceitar, porque se o Atlético te convida tu aceitas e só depois pensas. Foi com o coração, só depois veio a razão. E neste momento é como se dessem a um pintor uma tela em branco e tivesse que criar uma obra-prima. É essa a motivação neste momento. Voltar a colocar o clube onde estava fazendo mais com menos. Provando que o dinheiro, apesar de fazer a diferença, não é tudo. Quando eu digo que nenhum atleta ou treinador pediu avença normalmente ficam surpreendidos. Mas a verdade é que representar o Atlético é uma motivação muito forte.

Qual a estrutura existente e quais são as ambições desportivas?
A nível directivo é o Vice-Presidente, o Dr. Carlos Filipe. Eu como Coordenador da equipa sénior e júnior. O Luís Lobato, homem de grande experiência no futsal e que regressa ao Atlético, para as camadas mais jovens. A nível de secretaria o Sr. Vítor Domingues, funcionário de longa data do Clube. Depois há o Tiago Mendes que ajuda, consoante a sua disponibilidade, na parte logística.

Ao nível de treinadores, a equipa sénior é liderada pelo Carlos Matos. Um treinador jovem mas que encaixa perfeitamente no perfil que definimos. É ambicioso, disciplinador, competente e conhece bem a divisão em que competimos. Nos júniores está o Domingos Morais, coadjuvado pelo Francisco Morais e pelo Hugo Mendes. Três homens de Alcântara, que além das suas qualidades como treinadores de futsal, têm uma dimensão humana gigante. Além disso conhecem bem o clube. O Domingos vai para a sua terceira época e o Francisco já foi nosso atleta. Sendo os três de Alcântara, o Atlético sempre foi um clube que acompanharam nas suas vidas desportivas. E a identificação com a casa é algo que para mim é muito importante.

Falando de objectivos concretos, a história do clube na modalidade coloca-nos uma pressão que, apesar de não ser indesejada, é grande. Nenhum sócio deste clube aceitará menos que a subida de divisão. E, muito sinceramente, é esse o compromisso que assumimos internamente. Queremos subir. Agora, fazê-lo sozinhos torna tudo muito mais complicado. Os sócios e o futsal divorciaram-se, passe a expressão, há já alguns anos. E isso entristece-me. São muito poucos os associados que vêm ao pavilhão. Nós trabalhamos aqui pelo clube. Isto dá trabalho. Treinar às 22:30 da noite, sair daqui já perto da uma da manhã, depois jogar ao sábado. Chegamos ao jogo e vemos que são poucos os que estão lá para nos apoiar, para nos ajudar a vencer os jogos. A nível psicológico é algo que mexe com a equipa. Não há que esconder. Queremos os sócios connosco. Queremos festejar com eles. E, porque isto é desporto, às vezes também precisamos do ombro amigo deles.

A nível dos juniores o objectivo é formar. Para mim a formação não se trata de vitórias, mas sim de formar jogadores que possam integrar o plantel sénior, além da componente cívica. Isso é que é importante. Andar aqui a ganhar só porque é bonito, a mim não me diz nada. Quero que os juniores tenham espaço para crescer e se potenciar, de forma a que possam dar o salto para a equipa sénior.

Ruben Simões, capitão na temporada passada, aceitou continuar para ajudar a conduzir o Atlético ao lugar que merece.
A nível de jogadores, como estamos?
O nosso capitão, Ruben Simões, aceitou ficar para liderar a equipa. Teve propostas, algumas financeiramente apelativas, mas decidiu ficar. Vou confessar uma coisa que ele me disse e com a qual eu concordo a todos os níveis. "Agora é que vamos ver quem é do Atlético!" O Ruben é um exemplo de humildade. Com a carreira que tem, e com a qualidade que tem, podia ter outro tipo de atitude. Mas não. Está cá e com toda a motivação para levar o Atlético de volta ao lugar que merece.

Depois há jogadores que não são propriamente desconhecidos para quem acompanha o futsal lisboeta, além de três jovens que passaram pela nossa formação, que são os casos do Rodrigo Cordeiro, do Rogério Pancas e do Gonçalo Ramos. Além desses, o Ruben Simões também passou pela nossa formação do futebol, assim como o André Cardoso. O Vu também tem alguns anos de casa, o Codé transita do ano passado. Portanto a equipa está bem ciente do que é o Atlético e da exigência que existe quando vestem a camisola. O objectivo foi mesclar a experiência na divisão com a qualidade individual e o compromisso, além da identificação com o Clube.

O campeonato é longo, com 34 jornadas...
Exacto. Muito longo e será duro. Todos nos vão querer ganhar e teremos de saber lidar com isso. Haverá jogos em que só a qualidade individual não vai chegar. E preciso atitude, fazer das tripas coração. Todos os jogadores estão cientes do peso que a nossa camisola tem, para o bem e para o mal. E tudo farão para a defender com honra e galhardia. Caso contrário o seu destino ficará traçado. Enquanto eu aqui estiver, quem não estiver aqui para dar tudo o que tem, não está cá a fazer nada. Quem veste esta camisola tem de estar preparado para dar tudo, para disputar cada bola como se fosse a última. Um Atlético não desiste, resiste. Ver alguém fazer figura de corpo presente é algo que eu não vou aceitar. Perder é desporto, acontece. Agora, perder porque não demos tudo o que tínhamos, isso é inaceitável.

Estás satisfeito com as condições de trabalho?
Sim. Talvez falte uma coisa pontualmente, mas no essencial temos o que precisamos. Quando não temos, inventamos. Isso faz parte da vida. Encontrar soluções para chegar ao objectivo que pretendemos. Não vamos deixar de treinar porque uma meia tem um buraco ou a camisola não tem a cor certa. Isso são desculpas.

Como vê o actual panorama do Atlético Clube de Portugal, existe potencial junta da modalidade?
O potencial está limitado por aquilo que o Clube consegue fazer. Para já, existe uma limitação enorme que é o espaço para treinar. Só existe um pavilhão na Tapadinha, e está congestionado. Além do futsal existe o basket. E para encaixar mais equipas vamos tirar tempo de treino aos que já cá estão, e isso depois prejudica uns e beneficia outros. Tem que existir igualdade, não podemos prejudicar ninguém.

Depois, a nível financeiro, com a crise que o Clube atravessa, ter mais equipas sem haver patrocinadores ou meios de subsistência é aumentar o buraco. E isso é algo impossível.

Conseguindo resolver estas duas limitações, e é possível, o potencial do Clube é imenso. Tem tudo para poder ombrear com qualquer equipa a nível nacional.

Desafiámos o entrevistado a dirigir umas palavras à claque, apoiantes e associados do clube alcantarense.
Espero que compreendam a posição em que estamos e o compromisso que assumimos. O Atlético existe pelos sócios, e sem eles não somos nada. Apoiem estes atletas, dêem-lhes carinho, ajudem-nos a vencer jogos. Isto tudo só fará sentido se estiverem com o clube. Um clube sem apoio dos sócios é um clube condenado. Precisamos de vocês e do vosso apoio. Venham ao Atlético!

Aos Yellow Devils, espero que estejam sempre com a gente. Há uns anos havia outra claque que acompanhava o Futsal e foram importantíssimos para a subida de Divisão na altura. Espero que os Yellow Devils tenham a mesma influencia e que em Maio estejamos todos a festejar.

A Redacção

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